14.1.08

Sobre o rosto do verbo.

No princípio era o verbo. E no fim também. De fato, o verbo reina há muito tempo em nossa sociedade eurocêntrica como a principal interface entre os homens. Com o lento processo de codificação verbal que culminou na formação dos idiomas, o ser humano foi deixando em segundo plano outros padrões de linguagem, como, por exemplo, a linguagem gestual. A própria imagem, antes soberana nas pinturas rupestres, totens, esculturas, etc., cede uma enorme fatia do bolo para a recém descoberta tecnologia: o idioma. Assim, tivemos o surgimento do alfabeto como, talvez, a mais importante das invenções da coisa autoconsciente a que nomeamos homo sapiens, desencadeando uma revolução tecnológica que se faz sentir até hoje, como uma das tecnologias possibilitadoras da própria internet. Devemos muito dos nossos saberes constituídos no decorrer de nossa história ao poder comunicacional do verbo. Mas e enquanto as outras formas de linguagem? E enquanto a imagem?

A invenção do papel, da tipografia, bem como outros suportes próprios para a linguagem verbal ajudaram a divulgar o poder da escrita. Por muito tempo, o mais popular meio de reprodução em massa usava um padrão de linguagem que tinha como tecnologia de transmissão de idéias, o verbo. A fotografia mesmo só foi aparecer muito tempo depois dos tipos móveis. Mas com o século XX acontece uma reviravolta. Tecnologias que possibilitaram a reprodução em massa da imagem (juntamente com o som) surgiram no mundo. Rádio, TV e internet inundam o habitat natural com áudio e vídeo, causando uma mudança significativa no modo como vive o animal dito racional. Mas a minha pergunta, que obviamente não conseguirei responder é: a invasão e a popularização de um suporte tecnológico que permita o desenvolvimento de outras linguagens que não a verbal-oral-escrita, poderá construir um mundo onde os seres humanos poderão interagir e se comunicar usando outro padrão que não o verbal? As possibilidades de uma linguagem imagética se desenvolverão de forma independente com a evolução das tecnologias da comunicação, ou ficará ela sempre dependente do código verbal, submissa a uma legenda que a explique racionalmente em uma seqüência de letras?

O que sabemos com certeza é que o verbo não dá conta de toda a realidade, sendo apenas uma maneira de abordar a nossa constante tentativa de representar o mundo. Mas se estamos certos disso, por que não darmos chance a outras formas de representação tentar dar conta do que a linguagem verbal não consegue contemplar?